Black Sabbath in Rio - Praça da Apoteose - XIII-X-XIII
Texto de Marcelo Veira
Imagens de Frederico Sueth
Antes de qualquer
coisa, esse texto não é uma crítica. Está muito mais para um testemunho de fé;
algo que eu espero que os meus filhos — se um dia eu os tiver — leiam.
Domingo, 13 de outubro
de 2013. Rio de Janeiro dividido em três facções bem definidas pelos eventos a
serem realizados na data. Clássico do futebol carioca no Maracanã — apesar de
que nas ruas só se via torcedores de um dos clubes, mas ok —, parada gay e show
de heavy metal. Mas não se tratava de um show qualquer. Na verdade, há tempos
não se via tanta mobilização por parte de tantos tipos diferentes.
O que o Black Sabbath
promoveu na noite do último domingo na Praça da ApoteOZZY ultrapassou todos os
limites que podem ser agregados à palavra show. O velho encontrou o novo numa
celebração ao gênero musical que conta com os adeptos mais fiéis e apaixonados.
Lá estavam milhares e eu era mais um na multidão, um pixel. Mas nunca me senti
tão importante como ontem. Se restava alguma dúvida de que o metal é algo que
agrega, não resta mais. Na condição de religião do contraponto, o rock tem no
Sabbath o alto clero. E na figura de Ozzy Osbourne, o papa.
Bastou o acorde
inicial de "War Pigs" para os meus olhos ficarem marejados. Eu estava
diante dos pais do heavy metal, essa criança rebelde. É aquilo: TUDO que veio
depois teve origem com aqueles caras. Toda a estética do gênero é definida a
partir do molde estabelecido por Ozzy, Tony Iommi, Geezer Butler e Bill Ward,
cuja falta eu duvido que tenha sido sentida ante a competência de Tommy
Clufetos ao ocupar o banquinho mais desejado por qualquer baterista na face da
Terra. Ao término da canção de abertura, pensei: "Sobrevivi". Mas
será que durarei muito mais do que isso?
Durante aquelas duas
horas, me senti como se estivesse assinando o meu nome no livro de visitas do
inferno. O timbre da guitarra de Iommi, algo como uma curetagem na alma,
misturado à pulsação sobrenatural do baixo de Butler, somados a um Ozzy
cantando como há anos não se via e dando um show a parte com suas corridinhas,
enfiando a cara num balde e até mesmo abocanhando um morcego de borracha,
entregue por alguém da turma do gargarejo — que acabou voltando para casa de
banho tomado, se é que vocês me entendem. Agora eu pergunto: se o próprio pai
do heavy metal faz piada e leva todo mundo a rolar de rir por ser um completo
sequelado, quem ousa dizer que rock e diversão não podem — e devem — andar de
mãos dadas?
Quem achou satânica a
performance do Ghost no Rock in Rio é porque, certamente, não faz a menor ideia
da atmosfera macabra que tomaria conta da Praça da Apoteose durante a execução
da música que dá nome à banda e ao álbum que corresponde ao Livro do Gênese do
heavy metal. Todos os olhos vidrados na figura de Ozzy, o escolhido do demo, em
interpretação aterrorizante e incrivelmente convincente. Quatro décadas mais
tarde e mesmo após a queda de vários mitos com a verdade vindo à tona, a canção
apavora. Fiquei estático diante daquele convite a ingressar no lado negro da
força, e a sensação foi a mesma de quando eu ouvi aquilo pela primeira vez, há
mais de uma década e, sem pestanejar, aceitei o convite.
As canções de 13
foram estrategicamente inseridas no setlist, o que não evitou, entretanto,
certo estranhamento. No DVD Live in Detroit, Peter Frampton mete a real:
"Eu sei que vocês não gostam de ouvir músicas novas... mas nos dêem uma
chance!".
No fundo, é isso que
fica subentendido sempre que um artista ou banda das antigas inclui novidades
no repertório.
Pois bem, a chance foi dada, e o arrependimento foi zero. "Age of Reason", "End of the Beginning" e "God is Dead?" funcionaram muito bem ao vivo. E se não foram festejadas como as clássicas, pelo menos, deixaram a certeza de que o círculo fora fechado em altíssimo nível. Não ficarei surpreso se a procura pelo álbum subir nos próximos tempos.
Pois bem, a chance foi dada, e o arrependimento foi zero. "Age of Reason", "End of the Beginning" e "God is Dead?" funcionaram muito bem ao vivo. E se não foram festejadas como as clássicas, pelo menos, deixaram a certeza de que o círculo fora fechado em altíssimo nível. Não ficarei surpreso se a procura pelo álbum subir nos próximos tempos.
Apesar de o palco não
apresentar nenhum adereço — vide Judas Priest e Iron Maiden, que apostam pesado
nesse aspecto —, o que se via nos telões era praticamente literatura visual
cujo roteiro seguia à risca a música tocada no momento: imagens de filmes B,
assim como registros históricos de guerra e até mesmo uma miscelânea de
erotismo em preto e branco e pin-ups durante "Dirty Women".
Além dessa, outros
sons mais obscuros foram resgatados, como "Under the Sun", "Into
the Void" e "Behind the Wall of Sleep". A reta final incluiria
ainda "Iron Man" e "Children of the Grave". A introdução de
"Sabbath Bloody Sabbath" no bis acendeu o pavio do barril de pólvora
que explodiu em "Paranoid", a última da noite, na forma de rodinhas e
a impressão de que as arquibancadas viriam abaixo com tanta gente pulando ao
mesmo tempo.
A história diz que o
Black Sabbath inventou o heavy metal. O show deles me fez ter certeza que eles
também inventaram o diabo. Nunca dizer "obrigado por tudo" fez tanto
sentido.
Obrigado, Black
Sabbath! Por tudo
Abaixo temos alguns momentos deste show antológico
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